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25 de Abril de 2024
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    A primeira estação de televisão do Brasil

    A Segunda Guerra Mundial, que durou de 1939 a 1945, interrompeu as experiências com a televisão no Brasil, que somente foram retomadas em 29 de setembro de 1948, sob a direção de Alceu Fonseca. Através da Rádio Industrial de Juiz de Fora, foram transmitidos programas, inclusive o Congresso Eucarístico, os festejos do centenário da cidade e o jogo de futebol entre o Clube Tupi da cidade e o Bangu do Rio de Janeiro.

    No Rio de Janeiro, o diretor da rádio Nacional Victor Costa, no final da década de 1940, fez uma experiência com a televisão, em circuito fechado, nos estúdios da PRE-8, localizado no alto do edifício do jornal A Noite, o mais alto da então capital federal.

    Assis Chateaubriand, como homem de imprensa, resolveu no início de 1949 ter também a sua emissora de televisão, apesar de saber que as emissoras norte-americanas estavam no vermelho desde sua criação, no pós-guerra. Somente em 1951 o segmento começou a apresentar resultados financeiros satisfatórios.

    O pai da televisão brasileira

    Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Mello nasceu na cidade de Umbuzeiro, Estado da Paraíba, em 4 de outubro de 1892, dia de São Francisco de Assis. Estudou no Ginásio Pernambucano, em Recife.

    Com apenas 15 anos, entrou para a Faculdade de Direito da capital do Estado, da qual viria a se tornar professor de Filosofia do Direito e Direito Romano, após conquistar o primeiro lugar em concurso seletivo, em 1915, sendo nomeado para o cargo pelo presidente da República Venceslau Brás. Ainda em Recife, iniciou sua carreira jornalística, escrevendo para o Jornal do Recife, que publicou seu primeiro artigo em 1910, colaborou também no Jornal Pequeno e nas colunas do Diário de Pernambuco, chegando a redator-chefe desse órgão de imprensa, o mais antigo da America Latina.

    No ano de 1917, transferiu-se para o Rio de Janeiro e passou a escrever para A Época, o Jornal do Commércio e o Correio da Manhã. Em 1924, assumiu a direção de O Jornal, embrião da maior cadeia de empresas de comunicação do Brasil, os Diários e Emissoras Associados, que criou e dirigiu. A empresa chegou a possuir 34 jornais; 36 emissoras de rádio; 18 estações de televisão; uma agência de notícias; uma revista semanal, a famosa O Cruzeiro; a mensal A Cigarra, voltada ao público feminino; várias revistas infantis e uma editora.

    Engajado no movimento político, Chateaubriand apoiou a Aliança Liberal na campanha que teve por desfecho a vitória da Revolução de outubro de 1930, que conduziu Getúlio Vargas ao poder. Em 1932, participou da Revolução Constitucionalista, dando seu apoio à causa paulista, que resultou na tentativa frustrada do governo em mandá-lo para o exílio no Japão. Ele permaneceu no Brasil e fixou residência na cidade de São Paulo. No ano de 1935, com a presença do famoso inventor italiano Guglielmo Marconi, especialmente convidado, inaugurou a sua primeira emissora de rádio, a PRG-3, rádio Tupi, na cidade do Rio de Janeiro.

    Progressista, promoveu em 1941 a Campanha Nacional de Aviação, com o slogan "Dêem asas ao Brasil", e fundou mais de 400 centros de puericultura no país. Em 1945, recebeu o importante prêmio de jornalismo Maria Moors Cabot, com os jornalistas Luis Teofilo Nuñez, da Venezuela, e Tom Wallace, dos Estados Unidos, concedido pela Columbia University, de Nova York.

    Grande incentivador da cultura, criou, em 1947, o Museu de Arte de São Paulo - MASP, um dos mais importantes do mundo, que leva seu nome e se localiza na Avenida Paulista. O prédio que abriga o museu foi concebido especialmente pela arquiteta Lina Bo Bardi e inaugurado em novembro de 1968, com a presença da rainha Elizabeth II da Inglaterra, quando de sua visita oficial ao Brasil. Hoje é um dos cartões postais da cidade e de valor inestimável para o país pelo seu acervo de 8 mil peças, integrado por obras de artistas de renome como Renoir, Monet, Manet, Cézanne, Toulouse-Lautrec, Van Gogh, Gauguin, Modigliani, El Greco, Goya, Velázquez, Rembrandt, Calder, Torres Garcia, Diego Rivera, Siqueiros e os brasileiros Almeida Junior, Cândido Portinari, Anita Malfatti, Victor Brecheret e Flávio de Carvalho. E uma coleção completa de 73 esculturas do famoso artista francês Edgar Degas, além de três pinturas de sua autoria.

    No ano de 1950, Chateaubriand fundou a primeira emissora de televisão da América do Sul, em São Paulo. Em 1952, foi eleito senador pelo Estado da Paraíba e, posteriormente, no ano de 1955, pelo Estado do Maranhão, tendo renunciado a este mandato dois anos depois, para assumir a embaixada do Brasil no Reino Unido, a convite do presidente Juscelino Kubitschek. No ano de 1954, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras, na cadeira deixada por Getúlio Vargas, assumindo a vaga no ano seguinte. Conhecido como "Velho Capitão", foi vitimado, em 1960, por uma trombose que o deixou tetraplégico, mas lhe preservou a consciência. Após vários tratamentos e muita fisioterapia, voltou a escrever seus artigos, publicados em seus jornais quase que diariamente, graças a um mecanismo próprio na máquina de datilografia, especialmente adaptada. Em sua longa carreira jornalística, foram cerca de 11.870 artigos. Assis Chateaubriand faleceu em 4 de abril de 1968, na cidade de São Paulo.

    Patrocínio

    O surgimento da televisão brasileira teve a participação efetiva do Moinho Santista, Sul-América de Seguros, Cervejaria Antarctica Paulista e Laminação Nacional de Metais, empresas que entraram com o capital necessário para o empreendimento, pagando adiantado por um ano de publicidade à cadeia dos Associados. Chateaubriand foi para os Estados Unidos verificar a possibilidade da instalação no Brasil desse meio de comunicação e a aquisição de toda a aparelhagem necessária, orçada na astronômica cifra de 5 milhões de dólares, ou 16 milhões de cruzeiros na época.

    A ideia inicial era que a primeira emissora fosse montada no Rio de Janeiro, então capital do país, para a cobertura da Copa do Mundo de 1950, que seria realizada no Brasil e em outras cinco cidades, entre 24 de junho e 16 de julho daquele ano, com jogo de abertura e da final no estádio do Maracanã, especialmente construído para o certame, que contou com a participação de 13 países. A empresa contratada inicialmente para montar todo o equipamento de transmissão foi a norte-americana General Electric, mas esta encontrou obstáculos para concretizar a atividade no prazo estipulado em contrato com os Diários Associados.

    A primeira dificuldade foi a negativa da Igreja Católica para permitir o uso do morro do Corcovado, onde localiza-se o Cristo Redentor, para a instalação da torre de transmissão da televisão Tupi. Era o ponto mais apropriado pela altitude, de mais de 700 metros, do qual todos os pontos do Rio de Janeiro receberiam imagens com nitidez e qualidade. Os engenheiros foram obrigados a procurar um outro local que tivesse condições de receber a torre e os equipamentos de transmissão. Foi então escolhido outro cartão postal da Cidade Maravilhosa, o morro do Pão de Açúcar.

    Não foram poucos os problemas surgidos para a realização de todo o trabalho, principalmente para levar até o local todo o material de alvenaria destinado à construção do prédio que abrigaria o transmissor e a torre. Ferro, areia, cimento, pás, madeira e também os operários só tinham um meio de transporte até o topo do morro, o bondinho. O primeiro trecho ia da Praia Vermelha até o Morro da Urca, e o segundo ia da Urca ao Pão de Açúcar.

    Ao final, verificou-se com os diversos percalços surgidos, que não haveria tempo de colocar no ar a emissora carioca. Decidiu-se então pela instalação em São Paulo, cabendo a missão para a RCA, que havia vendido os equipamentos para a implementação da emissora paulista. O local escolhido para a colocação da primeira torre de transmissão foi acertado, sem problemas, com o governo do Estado, sendo autorizada a utilização do prédio Altino Arantes, sede do Banco do Estado de São Paulo, então o mais alto edifício da capital paulista.

    Os estúdios ficariam no bairro do Sumaré, também localizado em uma topografia que abrangia toda a cidade de São Paulo, e onde já existia a chamada Cidade do Rádio, sede das rádios Associadas Difusora e Tupi, que cederiam seus artistas e técnicos para o novo meio de comunicação.

    Em meados de 1950, chegou dos Estados Unidos, a bordo de um navio Moore Mccormack Lines, o equipamento adquirido da RCA para a TV Associada de São Paulo, acompanhado pelo engenheiro americano responsável, destacado pela direção da RCA, Walther Obermuller, que era também diretor da NBC-TV de Nova York. Ele orientou a equipe de técnicos brasileiros, chefiada por Jorge Edo e Mario Alderighi. Assis Chateaubriand, acompanhado por vários artistas contratados por suas emissoras de rádio, entre eles Hebe Camargo, foi pessoalmente ao porto de Santos receber a valiosa carga.

    Durante os trabalhos de montagem dos equipamentos da RCA, o engenheiro Walther Obermuller perguntou a Alderighi e ao diretor artístico da emissora Dermeval Costa Lima quantos aparelhos de televisão existiam em São Paulo. A resposta deixou o técnico americano pasmo: nenhum. O próprio Obermuller foi conversar com Chateaubriand sobre o problema, que respondeu: "não esquente a cabeça, que tudo no Brasil da-se um jeito". A princípio, o jornalista resolveu importar 200 televisores, mas ao descobrir que a burocracia a ser cumprida atrasaria a entrega, não teve dúvidas: resolveu contrabandeá-los. O primeiro televisor do Brasil foi entregue de presente ao presidente da República, general Gaspar Dutra, no Rio de janeiro, apesar da capital do país não ter emissora de televisão na época. Metade da carga, Chateaubriand deu aos seus amigos e a outra metade foi vendida pelas lojas Cássio Muniz. Quando da inauguração da televisão em São Paulo, apenas cinco famílias paulistanas possuíam aparelhos de televisão em casa.

    Em julho de 1950, foi realizada a inauguração formal do Museu de Arte de São Paulo, na Rua Sete de Abril, 230, sede dos Diários e Emissoras Associados, na capital paulista, que contou com a presença do presidente da República general Eurico Gaspar Dutra, autoridades, artistas de rádio, políticos e o convidado especial, o presidente do Museu de Arte Moderna de Nova York, o milionário Nelson Rockefeller. Ao término dos discursos, o frei franciscano José de Guadalupe Mojica, antigo astro de Hollywood, especialmente contratado para o evento, cantou o bolero Besame. Chateaubriand exigiu que toda a cerimônia fosse transmitida pela televisão, o que foi feito em circuito fechado, com a colocação de um aparelho de televisão no saguão do edifício e outro ao ar livre, na esquina das ruas Sete de Abril e Bráulio Gomes.

    Na tarde do dia 18 de setembro de 1950, marcada para as 17h, mas iniciada com meia hora de atraso, no edifício sede dos Diários e Emissoras Associados, localizado na Rua Sete de Abril, bispo auxiliar de São Paulo Dom Paulo Rolim Loureiro promoveu uma cerimônia de bênção e batismo das câmeras e dos estúdios, transmitida pela televisão, com a presença de inúmeros convidados, entre eles o candidato ao governo paulista, professor Lucas Nogueira Garcez, eleito em 3 de outubro seguinte. O fundador Chateaubriand leu um discurso enaltecendo a novo meio comunicação e a madrinha da cerimônia, a poetisa Rosalina Coelho Lisboa Larragoiti leu uma oração que começava: "A televisão, essa criança desconhecida entre nós, no caso a criança tinha um pai... Assis Chateaubriand."

    Após o evento, todo equipamento da televisão foi transportado da sede dos Associados, no centro da cidade, para o estúdio no Sumaré, adaptado ao lado do prédio das rádios Associadas, Tupi, a PRG-2, e Difusora de São Paulo, PRF-3, que receberia a concessão da emissora de televisão, outorgada seis meses depois, através do Decreto 27.332, de 7 de março de 1951, pelo presidente Getúlio Vargas e o ministro da Viação e Obras Públicas Álvaro de Souza Lima. Mas a co-irmã Tupi é que acabou dando o nome à emissora de TV.

    *Antônio Sérgio Ribeiro é advogado, pesquisador e diretor do Departamento de Documentação e Informação da Assembleia.

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